segunda-feira, 29 de maio de 2017

Inimigo invisível

Cada vez mais jovens recorrem a medicamentos contra transtornos psicológicos

Por Maria Clara Pereira e Mariana Camargo

     A sociedade contemporânea vive sob a exigência de se alcançar o modelo ideal o mais rápido possível. Porém, a busca incessante pelo padrão de beleza e inteligência podem trazer sérias consequências, como o desenvolvimento de transtornos psicológicos, o que leva muitos jovens a recorrer a remédios psicotrópicos para controlar tais doenças. Segundo o Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos Controlados (SNGPC), de 2009 a 2014 houve um aumento de 161% no fornecimento de medicamentos controlados no país.

Os sintomas

     Segundo pesquisa realizada em 2016 pelo ERICA (Estudo de Riscos Cardiovasculares em Adolescentes), um em cada três dos adolescentes brasileiros sofre de transtornos mentais comuns (TMC), caracterizados por tristeza frequente, dificuldade para se concentrar ou para dormir, falta de disposição para tarefas do dia a dia, entre outros sintomas. Quando não tratados, esses podem evoluir para distúrbios mais sérios, como a depressão.
     A adolescência é marcada por excesso de transformações, associado a isso as pressões impostas pela sociedade (padrão de beleza, notas boas, escolha de uma profissão), e até mesmo pelos pais, pode desencadear na manifestação de diagnósticos de transtornos mentais. A psicóloga Bruna Garcia, 27 anos, concorda “é a associação de vários fatores que propiciam o desenvolvimento de um transtorno mental, e os padrões impostos pela sociedade fazem parte do ambiente em que vivemos, portanto é uma fonte de influência de peso significativo, principalmente para os adolescentes”.

O aumento no consumo

    Segundo dados da Secretaria Municipal da Saúde, a quantidade de usuários de medicamentos psicotrópicos em São Paulo teve um aumento de 47% entre 2010 e 2014. O estudante de ciências políticas Fernando Bernardo Júnior, 20 anos, fez uso de medicamentos durante cinco meses após ser diagnosticado com depressão e tendência suicida em 2011, mas diz que se sentiu melhor depois que voltou a ser atleta e parou de se medicar, “além de fortes efeitos colaterais (insônia, tontura, tremedeira, falta de apetite), a pior sensação era a de apatia a qual o remédio me induzia”.
     A alta no uso de tais medicamentos reflete maior conhecimento da doença e aumento de diagnósticos, mas também levanta o alerta de uso indevido desses, até por pessoas saudáveis que buscam aumentar o rendimento em atividades intelectuais. “O risco é a farmacodependência, além de efeitos colaterais como alteração do ritmo do sono, comprometimento da cognição, humor e pensamento prejudicados. O psiquiatra deve ser consultado para orientar tais medidas” afirma o psiquiatra Antônio Tornich.

O papel da família

     A estudante de ensino médio AP, 17 anos, pensa que “a falta de comunicação com os pais, a falta de liberdade, atrapalha muito”, quando na verdade o papel da família é totalmente o oposto ao lidar com um adolescente, seja ele doente ou não. “Para a família perceber se algo está acontecendo é essencial ter o diálogo. É estar junto, orientar e, a qualquer indício de que algo não esteja bem, buscar um auxílio profissional” acrescenta a psicóloga. 
     Muitas vezes família e amigos do paciente se negam a aceitar sua condição e dizem que é apenas para chamar atenção. Fernando afirma que “isso afeta negativamente aqueles que sofrem com esses problemas. Quando se é atacado dessa forma fica ainda mais difícil combater aquilo que te derruba”. Para combater esse tipo de opinião, Bruna recomenda a conscientização: “Quanto mais informações as pessoas obtiverem, elas terão mais discernimento, compreensão e entendimento, e assim, conseguirão desconstruir cada vez mais a imagem que lhes foi passada”.
     Deve-se lembrar que esses sintomas não devem ser ignorados e em hipótese alguma o paciente deve se automedicar. Os transtornos psicológicos devem ser tratados com auxílio de profissionais da área, os quais têm competência para conduzir um tratamento de maneira adequada, seja com sessões de terapia ou medicação correta. Só assim o paciente pode apresentar melhoras, sem correr risco de prejudicar sua própria saúde.