quarta-feira, 5 de abril de 2017

Diga não ao abuso

Número de mulheres que sofrem violência sexual em ambiente universitário é alarmante

Por Maria Clara Pereira e Mariana Camargo

Segundo pesquisa realizada em 2015 pelo Data Popular, 67% das alunas universitárias já sofreram algum tipo de violência no ambiente universitário, 28% foram vítimas de violência sexual, e 27% dos meninos não consideram violência tentar abusar da garota se ela estiver sob efeito de álcool. 73% dos estudantes conhecem casos de alunas que já foram abusadas, o ambiente universitário estimula a estrutura patriarcal ao manter a tradição de que calouros devem obedecer e servir aos veteranos, ao cultivarem a cultura de cantar músicas ofensivas nos jogos universitários, ao ter professores homens em sua maioria, ao não dar voz às garotas, ao não apresentarem nenhuma resolução para tais problemas, mesmo sendo direito dos alunos recorrer à universidade.

Coletivos

É nesse contexto em que os coletivos feministas universitários ganham força. Diante de tantos relatos e nenhuma atitude tomada, as garotas resolveram se organizar para darem apoio umas as outras e conscientizarem as pessoas de que o corpo da mulher não é objeto de uso público. Na Faculdade de Medicina de Itajubá (FMIT) o coletivo existe há dois anos promovendo rodas de conversas para ajudar e orientar as estudantes, produzindo cartilhas de conscientização (sobre a Lei Maria da Penha, por exemplo), e contam também com a assistência de uma psicóloga e uma assistente social fornecidas pela Secretaria de Políticas Públicas Municipal.  
A aluna de medicina Julia Kalil, 19 anos, faz parte do coletivo da FMIT, e, segundo ela, a falta de atitude da faculdade faz com que até mesmo as meninas que não se consideram feministas acabem recorrendo ao coletivo em momentos de necessidade. Segundo os dados do Data Popular, 88% dos alunos e 95% das alunas compartilham da opinião de que a universidade deveria criar meios de punir os responsáveis por cometer violência contra mulheres na instituição. Julia acrescenta que o problema maior se dá por ser difícil mudar uma construção social já existente, mas que aos poucos mudanças são conquistadas. “De uma maneira geral, a gente têm conseguido avançar. A própria existência do coletivo já faz com que as meninas tenham mais coragem de se posicionar”.

Vítima

Após uma festa em uma república estudantil de Ouro Preto, Letícia Guisard, 20 anos, aluna de arquitetura na época, relata ter sido abusada por um veterano quando ainda era caloura. “Foi horrível, nunca pensei que alguém ia passar a mão em todas as partes do meu corpo sem eu querer. Essa é a pior situação: você não quer aquilo, você não está confortável com aquilo e a pessoa fica te forçando.” Mesmo após anos, Letícia diz que nunca teve coragem de contar para as amigas que moravam com ela o que aconteceu por não se sentir segura e ter medo do que poderia enfrentar, já que o ambiente na cidade é muito hierarquizado e machista.

                              Foto por Mariana Camargo

Que medidas tomar?

 A orientação é que se adote medidas legais independente do tipo de abuso sofrido, seja ele físico ou psicológico. A advogada Ana Paula Braga, 25 anos, recomenda que a vítima se dirija o quanto antes para uma delegacia de polícia (preferencialmente da mulher) e registre o boletim de ocorrência, pois somente com este ela poderá ser encaminhada para o Instituto Médico Legal (IML) para realizar os exames de corpo de delito e toxicológico. “São estas as provas que terão mais força na hora de condenar o agressor, e elas tendem a desaparecer muito rápido.” Embora a violência ocorra fora do campus, é de responsabilidade da instituição zelar por seus estudantes, as medidas variam se esta é pública ou particular.
Por ser uma forma de abuso tão naturalizada, as mulheres demoram a se dar conta da violência que sofreram, chegando até a aceitarem isso como consequência de seu abuso do álcool e/ou drogas, 42%das mulheres já sentiram medo de sofrer violência no ambiente universitário. Não são raras as vezes em que o agressor é próximo à vítima, podendo ser seu namorado, amigo ou até mesmo professor e usar de sua hierarquia para ameaçar a vítima caso esta queira puni-lo. “A rigor, uma passada de mão não consentida, um beijo forçado ou qualquer outro ato que envolva intimidade e teor sexual é considerado estupro”, segundo Ana Paula, e deve ser denunciado.