Quem são e como é a rotina das mulheres que conduzem os trens do metrô de São Paulo
Por Larissa Martin e Maria Clara Pereira
Sheila Sordi, 28 anos, usa óculos de grau por
cima dos olhos castanhos, tem cabelo na altura dos ombros, está sempre
sorrindo, é mãe do Fernando Sordi, 9 anos, e operadora de trem no metrô de São
Paulo nos trechos Vila Prudente e Vila Madalena da linha 2-verde. Fazia faculdade
de arquitetura, porém não terminou e nunca trabalhou na área. Começou o emprego
no Metrô devido ao seu interesse pela área, já que seu marido é agente de
segurança na estação. Sheila gosta muito do que faz atualmente. Em sua casa,
moram ela, o filho e o esposo, Marcelo Otávio da Silva, 35 anos. A família possui
uma rotina diferente da comum: tomam café e almoçam juntos, após o almoço o
filho vai para a aula e os pais vão juntos ao trabalho, os quais voltam cedo no
outro dia e a criança fica com a irmã de Sheila para que consigam conciliar os
horários de trabalho.
Sheila trabalha no Metrô paulistano há seis anos
e como operadora de trem há dois. Enquanto conta de seu cargo, sorri feliz,
confiante: “Tenho orgulho da profissão, pois interajo diariamente com o dia a
dia da cidade, transportando seus moradores, trabalhadores e turistas”. Quando
entrou na empresa, trabalhou três anos realizando atividades gerais (cargo
chamado de "quatro horas" na empresa) e depois desse tempo prestou um
concurso interno e conseguiu ser promovida, assumindo o cargo de condutora de
trens em período integral de segunda a sexta-feira.
Cynthia Macedo, 30 anos, é loira, usa uma
bandana vermelha no cabelo, brincos grandes de argola e seu batom vermelho é
bem destacado. Também é operadora de trem. Formou-se em publicidade e
propaganda, mas nunca exerceu a profissão. Desde o primeiro ano da faculdade
trabalha no Metrô. Como não estava conseguindo estágio na área em que estudava
e tinha amigos na empresa, resolveu prestar o concurso e passou. Trabalhou
durante seis anos na estação República, até que decidiu prestar o concurso
interno e se promover a condutora de trens na linha verde.
Enquanto trabalhava como “quatro horas”, Cynthia
fazia de tudo na estação. Ela conta que uma vez chegou até a presenciar um
parto na estação República: “Minha amiga que trabalha na segurança que fez o
parto”. Sua atual função também implica diversas responsabilidades como
manutenção dos trens, levá-los para seus respectivos blocos, sanar falhas,
inspecioná-los e prepará-los para que sejam limpos e aptos a serem utilizados.
Cynthia mora com os pais e está há nove anos no
Metrô, sendo três desses como condutora de trens. Os pais são metalúrgicos
aposentados e sempre a incentivaram a trabalhar na empresa. “Todas as apostilas
que eu recebi de treinamento meu pai lia e estudava comigo”, conta. Assim como
o marido de Sheila, o namorado de Cynthia também trabalha no Metrô. Ela afirma
que a profissão exige muita atenção o tempo todo: alguém que passa mal no vagão
e precisa que pare o trem, alguém que precisa de mais tempo para embarcar
devido a pouca mobilidade do indivíduo e tem de manter as portas abertas, os
embriagados em datas comemorativas, os SMS denúncia que são repassados para o
condutor, entre outros. “Já pediram minha ajuda algumas vezes pelo vidro da
cabine”, completou.
Hoje em dia, são dezenas de mulheres que operam
trens e metrôs e destacam-se no cargo. Ao contrário de antigamente, quando
muitos usuários (inclusive do sexo feminino) sentiam certo preconceito em serem
conduzidos por mulheres e achavam que uma mulher não seria capaz de exercer
tais atividades, consideradas para “macho”. E elas provam diariamente a todos o
contrário. Sheila conta que o preconceito hoje em dia está mais vedado: “O
usuário preconceituoso quando vê que é uma mulher pilotando, apenas disfarça e
não entra no carro”. Cynthia acrescenta:
“Sempre tem alguém que pergunta se sou eu que vou levar o trem”.
Nos últimos 50 anos, as mulheres têm ganhado
força total quando o assunto é mercado de trabalho e os avanços das leis
trabalhistas permitiram tal crescimento dessa mão de obra. Em 2007, as mulheres
representavam 40,8% do mercado formal de trabalho, já em 2016, passaram a
ocupar 44% das vagas. O desemprego causado pela atual crise do Brasil afetou
menos as mulheres nos últimos 5 anos do que os homens, segundo o Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), entre 2012 e 2016, o total de
homens empregados sofreu redução de 6,4% contra 3,5% das mulheres. A renda das
trabalhadoras também está ganhando destaque no cenário atual: 40% dos lares
familiares possuem uma mulher liderando a renda da família.
No metrô, antigamente somente homens conduziam
os trens, até que, em 1986, houve votações internas para decidir se as mulheres
também teriam direito de exercer a profissão. A empresa colocou inicialmente 20
mulheres num treinamento de 6 meses, o qual diria se elas estariam aptas ao
cargo. Dessas 20, três conquistaram o cargo e passaram a ser as primeiras
operadoras do metrô paulistano e do mundo. Hoje, em São Paulo, são 189 mulheres
operadoras de trens, representando 18% dos profissionais. Em Salvador, esse
dado chega a 20%, maior porcentagem de operadoras do país.
Logo após essa grande conquista, foram admitidas,
em 1989, mulheres na operação de ônibus e guinchos na ex-CMTC, empresa
municipal que operava ônibus na cidade de São Paulo. Depois disso, vieram as
agentes de trânsito da CET e a partir daí não pararam mais. Essas conquistas
todas das mulheres resultaram também na queda do índice de reclamações das
empresas pela metade, além da redução de acidentes recorrentes de trânsito e de
trens.
Sheila e Cynthia pretendem continuar suas
carreiras no metrô, pois enxergam a oportunidade de conduzir trens como um
avanço. Elas garantem que o local é muito bom para trabalhar e que a equipe é
unida e os colegas são extremamente prestativos. Uma equipe predominantemente
masculina, porém, isso não as abala, pois mesmo elas sendo a pequena
porcentagem feminina sabem de seus potenciais e garantem: a mulher tem a mesma
capacidade de realizar tais atividades e se orgulham disso.