segunda-feira, 27 de novembro de 2017

Elas nos trilhos

Quem são e como é a rotina das mulheres que conduzem os trens do metrô de São Paulo


Por Larissa Martin e Maria Clara Pereira

Sheila Sordi, 28 anos, usa óculos de grau por cima dos olhos castanhos, tem cabelo na altura dos ombros, está sempre sorrindo, é mãe do Fernando Sordi, 9 anos, e operadora de trem no metrô de São Paulo nos trechos Vila Prudente e Vila Madalena da linha 2-verde. Fazia faculdade de arquitetura, porém não terminou e nunca trabalhou na área. Começou o emprego no Metrô devido ao seu interesse pela área, já que seu marido é agente de segurança na estação. Sheila gosta muito do que faz atualmente. Em sua casa, moram ela, o filho e o esposo, Marcelo Otávio da Silva, 35 anos. A família possui uma rotina diferente da comum: tomam café e almoçam juntos, após o almoço o filho vai para a aula e os pais vão juntos ao trabalho, os quais voltam cedo no outro dia e a criança fica com a irmã de Sheila para que consigam conciliar os horários de trabalho.
Sheila trabalha no Metrô paulistano há seis anos e como operadora de trem há dois. Enquanto conta de seu cargo, sorri feliz, confiante: “Tenho orgulho da profissão, pois interajo diariamente com o dia a dia da cidade, transportando seus moradores, trabalhadores e turistas”. Quando entrou na empresa, trabalhou três anos realizando atividades gerais (cargo chamado de "quatro horas" na empresa) e depois desse tempo prestou um concurso interno e conseguiu ser promovida, assumindo o cargo de condutora de trens em período integral de segunda a sexta-feira.
Cynthia Macedo, 30 anos, é loira, usa uma bandana vermelha no cabelo, brincos grandes de argola e seu batom vermelho é bem destacado. Também é operadora de trem. Formou-se em publicidade e propaganda, mas nunca exerceu a profissão. Desde o primeiro ano da faculdade trabalha no Metrô. Como não estava conseguindo estágio na área em que estudava e tinha amigos na empresa, resolveu prestar o concurso e passou. Trabalhou durante seis anos na estação República, até que decidiu prestar o concurso interno e se promover a condutora de trens na linha verde.
Enquanto trabalhava como “quatro horas”, Cynthia fazia de tudo na estação. Ela conta que uma vez chegou até a presenciar um parto na estação República: “Minha amiga que trabalha na segurança que fez o parto”. Sua atual função também implica diversas responsabilidades como manutenção dos trens, levá-los para seus respectivos blocos, sanar falhas, inspecioná-los e prepará-los para que sejam limpos e aptos a serem utilizados.
Cynthia mora com os pais e está há nove anos no Metrô, sendo três desses como condutora de trens. Os pais são metalúrgicos aposentados e sempre a incentivaram a trabalhar na empresa. “Todas as apostilas que eu recebi de treinamento meu pai lia e estudava comigo”, conta. Assim como o marido de Sheila, o namorado de Cynthia também trabalha no Metrô. Ela afirma que a profissão exige muita atenção o tempo todo: alguém que passa mal no vagão e precisa que pare o trem, alguém que precisa de mais tempo para embarcar devido a pouca mobilidade do indivíduo e tem de manter as portas abertas, os embriagados em datas comemorativas, os SMS denúncia que são repassados para o condutor, entre outros. “Já pediram minha ajuda algumas vezes pelo vidro da cabine”, completou.


Hoje em dia, são dezenas de mulheres que operam trens e metrôs e destacam-se no cargo. Ao contrário de antigamente, quando muitos usuários (inclusive do sexo feminino) sentiam certo preconceito em serem conduzidos por mulheres e achavam que uma mulher não seria capaz de exercer tais atividades, consideradas para “macho”. E elas provam diariamente a todos o contrário. Sheila conta que o preconceito hoje em dia está mais vedado: “O usuário preconceituoso quando vê que é uma mulher pilotando, apenas disfarça e não entra no carro”.  Cynthia acrescenta: “Sempre tem alguém que pergunta se sou eu que vou levar o trem”.
Nos últimos 50 anos, as mulheres têm ganhado força total quando o assunto é mercado de trabalho e os avanços das leis trabalhistas permitiram tal crescimento dessa mão de obra. Em 2007, as mulheres representavam 40,8% do mercado formal de trabalho, já em 2016, passaram a ocupar 44% das vagas. O desemprego causado pela atual crise do Brasil afetou menos as mulheres nos últimos 5 anos do que os homens, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), entre 2012 e 2016, o total de homens empregados sofreu redução de 6,4% contra 3,5% das mulheres. A renda das trabalhadoras também está ganhando destaque no cenário atual: 40% dos lares familiares possuem uma mulher liderando a renda da família. 
No metrô, antigamente somente homens conduziam os trens, até que, em 1986, houve votações internas para decidir se as mulheres também teriam direito de exercer a profissão. A empresa colocou inicialmente 20 mulheres num treinamento de 6 meses, o qual diria se elas estariam aptas ao cargo. Dessas 20, três conquistaram o cargo e passaram a ser as primeiras operadoras do metrô paulistano e do mundo. Hoje, em São Paulo, são 189 mulheres operadoras de trens, representando 18% dos profissionais. Em Salvador, esse dado chega a 20%, maior porcentagem de operadoras do país.
Logo após essa grande conquista, foram admitidas, em 1989, mulheres na operação de ônibus e guinchos na ex-CMTC, empresa municipal que operava ônibus na cidade de São Paulo. Depois disso, vieram as agentes de trânsito da CET e a partir daí não pararam mais. Essas conquistas todas das mulheres resultaram também na queda do índice de reclamações das empresas pela metade, além da redução de acidentes recorrentes de trânsito e de trens.

Sheila e Cynthia pretendem continuar suas carreiras no metrô, pois enxergam a oportunidade de conduzir trens como um avanço. Elas garantem que o local é muito bom para trabalhar e que a equipe é unida e os colegas são extremamente prestativos. Uma equipe predominantemente masculina, porém, isso não as abala, pois mesmo elas sendo a pequena porcentagem feminina sabem de seus potenciais e garantem: a mulher tem a mesma capacidade de realizar tais atividades e se orgulham disso. 

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