Fora de casa, dentro do mundo
Estudante de jornalismo buscando mostrar pro mundo um pouquinho do que produz na faculdade.
quinta-feira, 29 de novembro de 2018
quarta-feira, 16 de maio de 2018
Casamento real gera debate sobre imigração no Reino Unido
Casada com Harry, Meghan
Markle traz foco a negros e imigrantes
Por Carolina Huertas, Maria Clara Pereira
e Mariana Camargo
A divulgação do casamento entre o
príncipe Harry e a atriz americana Meghan Markle, em novembro de 2017, levantou
na Inglaterra um período de discussão a respeito de racismo e xenofobia.
Imigrante e biracial, como ela mesma se identifica, a futura Duquesa de Sussex
vem modernizando a família real e quebrando estereótipos enraizados. Além
disso, Markle é envolvida em questões de igualdade de gênero, feminista
declarada, além de embaixadora da World Vision Canada, instituição que busca
melhoria de vida para crianças carentes, e tanta revolução está incomodando
algumas pessoas.
Em fevereiro deste ano o casal recebeu
uma carta anônima que continha um pó branco e foi julgada pela polícia
britânica como “crime de ódio racista”. O conteúdo depois foi atestado como inofensivo,
mas a carta era uma mensagem racista direcionada à atriz, filha de negros, e
está sendo investigada pela polícia. Também está sendo averiguada a possível
conexão entre esse acontecimento e uma outra correspondência recebida pelo
Parlamento em 13 de fevereiro contendo um pó branco similar.
Para alguns fãs, a
reação de algumas pessoas pode ser ríspida e preconceituosa, mas eles acreditam
que a entrada dela na família real representa muita coisa e pode influenciar
relacionamentos internacionais. “O fato de ela ser multirracial pode mudar o
relacionamento dos britânicos com a questão das raças. O simbolismo de um
casamento real é poderoso, mas leva tempo para as coisas se alinharem” declarou
Beata Kovacs, húngara, de 33 anos, que tem uma conta no Instagram dedicada à
atriz.
Aqueles que
acompanhavam Harry antes do relacionamento também acreditam no lado positivo da
presença de Megan. Bretty
Service, estudante londrino de 21 anos, é administrador de um fã clube do
príncipe, e desde que soube da notícia do novo casal, criou uma um fã clube
para eles também. “Eu criei a página pois sou fã do Príncipe Harry e do trabalho
de caridade que ele faz. Meghan é uma dama moderna e isso será ótimo para a
família real, estou feliz por eles”, declarou o britânico.
A questão racial
Segundo uma matéria do portal
britânico The Debrief, em 2016, o Reino Unido começou a perceber
lentamente que tem um problema racial tão grande quanto os Estados Unidos.
Segundo eles, as abordagens são diferentes, porém o preconceito racial está
enraizado no sistema político, perspectivas de emprego, mobilidade social,
justiça criminal e sistema educacional.
Erik Goldstein,
especialista em política externa britânica e professor de relações
internacionais na Universidade de Boston vê o futuro casamento real como mais
um passo nessa luta por igualdade: “O lado biracial de Meghan dá um fundo
interessante para sua história pessoal, seu casamento pode mostrar que os
imigrantes realmente têm um lugar em todos os níveis da sociedade britânica”.
Sandy Lauren,
professora e estadunidense administra o @harry_meghan_updates, uma
página sobre notícias sobre Meghan no Instagram que tem mais de 68 mil
seguidores. Ao comentar sobre o racismo e a xenofobia, ela declarou vestir a
camisa dessa luta também. “O racismo e a xenofobia, infelizmente, não só
crescem na Grã-Bretanha, mas também nos EUA. É um pequeno grupo de pessoas
menos instruídas e tolerantes, rápidas de julgar e fáceis de manipular com base
em teorias conspiratórias. E é por isso que nós deixamos claro na página
que o bullying e o racismo não serão tolerados”, disse a jovem de 27 anos.
Goldstein tem uma
visão diferente do assunto, ele diz que “a família real sempre foi muito cosmopolita, o
marido da rainha era um cidadão grego, que se tornou cidadão britânico
naturalizado. Meghan Markle sendo uma americana não é uma questão tão relevante
já que ela está claramente trabalhando em aprender sobre a sociedade
britânica”.
A relação com o Brexit
O termo Brexit é
a junção das palavras em inglês Britain (Grã Bretanha) e exit
(saída) e surgiu para representar a saída do Reino Unido da União Europeia, o
que aconteceu em 23 de junho de 2016, após um referendo no qual 51,9% dos
britânicos votaram a favor do desligamento. O Reino Unido é formado por quatro
países: Escócia, Inglaterra, Irlanda do Norte e País de Gales, sendo que todos
eles são governados por um único sistema parlamentar.
O referendo era uma das
promessas do primeiro ministro David Cameron caso vencesse as eleições
parlamentares de 2015, devido à pressão crescente para que o projeto Brexit
fosse levado a voto popular.
A União Europeia
enfrenta tensões históricas com o Império Britânico desde sua origem. Os
ingleses sempre foram opostos ao bloco, não abraçam uma identidade europeia,
nunca adotaram o euro como moeda, defendem sua soberania, o controle de suas
fronteiras. Os mais nacionalistas chegam a defender que a UE passou a ter um
controle muito grande sobre suas vidas.
Com a saída do bloco,
abriram-se as negociações quanto ao mercado único europeu, que depende muito do
Reino Unido. O país quer continuar com os benefícios de não pagar tarifas e nem
impostos aos outros integrantes do bloco, porém não quer mais permitir o fácil
acesso a imigrantes. O mercado único, a livre circulação de pessoas e capitais,
são os pilares da economia europeia, e, mesmo sendo possível ter acesso a tudo
isso sem participar do bloco, os quatro países dependem de acordos internos a
serem assinados a seu favor, porém alguns governos se sentem na obrigação de
puní-los por sua saída. As novas negociações são complexas justamente por
envolverem tratados internacionais e acordos comerciais, e a previsão é de que
serão concluídas somente em 2020.
Uma das principais reivindicações dos
partidários do Brexit era uma nova política migratória com medidas mais
restritivas. O Reino Unido terá que acatar com algumas condições se quiser
continuar tendo acesso à zona econômica da UE, mas é inegável o aumento da
xenofobia após o referendo, que promete não afetar tanto os imigrantes da UE,
mas será mais repressor com aqueles que são de outros continentes. Em 2015, 2,7
milhões de cidadãos de países terceiros migraram para a UE, o questionamento
aberto agora é o que será desses que estão na Grã Bretanha.
Mesmo alguns especialistas como Goldstein
dizendo que “não há razão para esperar que a situação dos cidadãos não
britânicos se torne ‘pior’”, no primeiro mês após o Brexit, foram
registrados um total de 5.468 crimes de ódio
cometidos na Inglaterra contra moradores de outras descendências. Dentre as
vítimas estão principalmente homosexuais, asiáticos, negros e muçulmanos.
Muitos relatam que os ataques foram feitos por jovens. Esse fato apenas reitera
que não necessariamente as gerações mais novas têm comportamento receptivo com
os estrangeiros.
O preconceito na visão dos imigrantes
O evento da saída do Reino Unido da União
Europeia dividiu a opinião pública e causou um notável impacto na imigração.
Segundo a publicitária Sofia Trevisani, residente em Londres há 10 anos, a
questão é recebida de maneira diferente entre a população da capital e os
moradores do interior. “Aqui sempre existiu muita imigração, a gente vive com
gente de todo lugar, todos os dias. Então, é muito normal. Londres por exemplo,
tem um prefeito da esquerda muçulmano, porém você não iria ver a mesma situação
em cidades menores”, conta ela.
Sofia associa a figura de Meghan Markle
recebendo um título de nobreza a uma possível retomada nas discussões acerca
desse tópico. Segundo ela, o que mais chama atenção na população não é
necessariamente o fato de Meghan ser imigrante, mas sim de ser metade negra.
“Eu acho que o casamento está trazendo muita discussão acerca de imigração e
racismo (...) falta muita educação ao redor disso e eu acho que o casamento
deles vai começar uma conversa”, opina a publicitária.
Moradora da capital inglesa há 13 anos, a
babá e faxineira Neilda Barbosa acredita que um dos motivos que minimizou a
negação à Meghan foi o fato da americana ter uma boa condição financeira e não
pertencer a uma classe social baixa, o que levanta um novo questionamento:
seria o preconceito não só racial, como também social?
Neilda também afirma já ter sido vítima
de xenofobia em um ponto de ônibus. Segundo ela, um nativo que não compreendeu
o que ela havia dito por conta do sotaque a chamou de indigna por não conseguir
se fazer entender.
Já a freelancer Renata Martins, que mora
em Londres desde 2000, afirmou ter uma ótima convivência com os cidadãos
ingleses no geral. “Como imigrante nunca passei por nenhuma situação de
preconceito, pelo contrário, sempre fui bem recebida e hoje tenho grandes
amizades com outros estrangeiros e ingleses”, ela diz. Segundo Renata, tudo
depende da localização, pois a recepção tende a ser bem mais agradável na
região sul do país. “No norte da Inglaterra ainda existe muito preconceito pelo
fato de ter menor quantidade de imigrantes. Em geral no norte da Inglaterra o
nível de educação é mais baixa”, explica ela.
Até setembro de 2016 foram registrados na
Inglaterra 240 mil pedidos de residência permanente por cidadãos europeus, e
até o final do mesmo ano, 90 mil ainda não haviam sido processados. A
justificativa dada sobre a demora no atendimento dessa demanda é que essa
lentidão ocorre devido a sobrecarga dos funcionários responsáveis pelo
processo. Sofia considera a situação problemática devido ao número excessivo de
pessoas que querem migrar para o país, já que segundo ela isso sempre foi um
problema. A maneira que a direita encontrou de solucionar esse contratempo foi
tomando atitudes extremas, sustentadas pelo voto da população que carrega um
perfil majoritariamente tradicional e muitas vezes retrógrado. A opção acatada
para solucionar a situação resultou no sucesso do controle de imigrantes, mas
refletiu diretamente na segurança da população, que ficou sujeita a sofrer
ataques fundamentados em pensamentos fascistas e orquestrados por uma parcela
xenofóbica da nação.
É de se esperar que o próximo casamento
real levante algum tipo de discussão em relação a esses temas polêmicos.
Meghan, que se afastou da carreira de atriz, tem se mostrado interessada em
participar de projetos filantrópicos, o que pode resultar na maior participação
dela em questões sociais voltadas à população britânica. Essa
representatividade trazida pela futura Duquesa de Sussex é pertinente ao
momento atual vivido pela Inglaterra e pode ser a esperança de muitos
imigrantes e negros que vêem nela uma chance de assegurar maior realce nas
pautas referentes à imigração, crimes de ódio, xenofobia e racismo no cenário
futuro do país.
segunda-feira, 27 de novembro de 2017
Elas nos trilhos
Quem são e como é a rotina das mulheres que conduzem os trens do metrô de São Paulo
Por Larissa Martin e Maria Clara Pereira
Sheila Sordi, 28 anos, usa óculos de grau por
cima dos olhos castanhos, tem cabelo na altura dos ombros, está sempre
sorrindo, é mãe do Fernando Sordi, 9 anos, e operadora de trem no metrô de São
Paulo nos trechos Vila Prudente e Vila Madalena da linha 2-verde. Fazia faculdade
de arquitetura, porém não terminou e nunca trabalhou na área. Começou o emprego
no Metrô devido ao seu interesse pela área, já que seu marido é agente de
segurança na estação. Sheila gosta muito do que faz atualmente. Em sua casa,
moram ela, o filho e o esposo, Marcelo Otávio da Silva, 35 anos. A família possui
uma rotina diferente da comum: tomam café e almoçam juntos, após o almoço o
filho vai para a aula e os pais vão juntos ao trabalho, os quais voltam cedo no
outro dia e a criança fica com a irmã de Sheila para que consigam conciliar os
horários de trabalho.
Sheila trabalha no Metrô paulistano há seis anos
e como operadora de trem há dois. Enquanto conta de seu cargo, sorri feliz,
confiante: “Tenho orgulho da profissão, pois interajo diariamente com o dia a
dia da cidade, transportando seus moradores, trabalhadores e turistas”. Quando
entrou na empresa, trabalhou três anos realizando atividades gerais (cargo
chamado de "quatro horas" na empresa) e depois desse tempo prestou um
concurso interno e conseguiu ser promovida, assumindo o cargo de condutora de
trens em período integral de segunda a sexta-feira.
Cynthia Macedo, 30 anos, é loira, usa uma
bandana vermelha no cabelo, brincos grandes de argola e seu batom vermelho é
bem destacado. Também é operadora de trem. Formou-se em publicidade e
propaganda, mas nunca exerceu a profissão. Desde o primeiro ano da faculdade
trabalha no Metrô. Como não estava conseguindo estágio na área em que estudava
e tinha amigos na empresa, resolveu prestar o concurso e passou. Trabalhou
durante seis anos na estação República, até que decidiu prestar o concurso
interno e se promover a condutora de trens na linha verde.
Enquanto trabalhava como “quatro horas”, Cynthia
fazia de tudo na estação. Ela conta que uma vez chegou até a presenciar um
parto na estação República: “Minha amiga que trabalha na segurança que fez o
parto”. Sua atual função também implica diversas responsabilidades como
manutenção dos trens, levá-los para seus respectivos blocos, sanar falhas,
inspecioná-los e prepará-los para que sejam limpos e aptos a serem utilizados.
Cynthia mora com os pais e está há nove anos no
Metrô, sendo três desses como condutora de trens. Os pais são metalúrgicos
aposentados e sempre a incentivaram a trabalhar na empresa. “Todas as apostilas
que eu recebi de treinamento meu pai lia e estudava comigo”, conta. Assim como
o marido de Sheila, o namorado de Cynthia também trabalha no Metrô. Ela afirma
que a profissão exige muita atenção o tempo todo: alguém que passa mal no vagão
e precisa que pare o trem, alguém que precisa de mais tempo para embarcar
devido a pouca mobilidade do indivíduo e tem de manter as portas abertas, os
embriagados em datas comemorativas, os SMS denúncia que são repassados para o
condutor, entre outros. “Já pediram minha ajuda algumas vezes pelo vidro da
cabine”, completou.
Hoje em dia, são dezenas de mulheres que operam
trens e metrôs e destacam-se no cargo. Ao contrário de antigamente, quando
muitos usuários (inclusive do sexo feminino) sentiam certo preconceito em serem
conduzidos por mulheres e achavam que uma mulher não seria capaz de exercer
tais atividades, consideradas para “macho”. E elas provam diariamente a todos o
contrário. Sheila conta que o preconceito hoje em dia está mais vedado: “O
usuário preconceituoso quando vê que é uma mulher pilotando, apenas disfarça e
não entra no carro”. Cynthia acrescenta:
“Sempre tem alguém que pergunta se sou eu que vou levar o trem”.
Nos últimos 50 anos, as mulheres têm ganhado
força total quando o assunto é mercado de trabalho e os avanços das leis
trabalhistas permitiram tal crescimento dessa mão de obra. Em 2007, as mulheres
representavam 40,8% do mercado formal de trabalho, já em 2016, passaram a
ocupar 44% das vagas. O desemprego causado pela atual crise do Brasil afetou
menos as mulheres nos últimos 5 anos do que os homens, segundo o Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), entre 2012 e 2016, o total de
homens empregados sofreu redução de 6,4% contra 3,5% das mulheres. A renda das
trabalhadoras também está ganhando destaque no cenário atual: 40% dos lares
familiares possuem uma mulher liderando a renda da família.
No metrô, antigamente somente homens conduziam
os trens, até que, em 1986, houve votações internas para decidir se as mulheres
também teriam direito de exercer a profissão. A empresa colocou inicialmente 20
mulheres num treinamento de 6 meses, o qual diria se elas estariam aptas ao
cargo. Dessas 20, três conquistaram o cargo e passaram a ser as primeiras
operadoras do metrô paulistano e do mundo. Hoje, em São Paulo, são 189 mulheres
operadoras de trens, representando 18% dos profissionais. Em Salvador, esse
dado chega a 20%, maior porcentagem de operadoras do país.
Logo após essa grande conquista, foram admitidas,
em 1989, mulheres na operação de ônibus e guinchos na ex-CMTC, empresa
municipal que operava ônibus na cidade de São Paulo. Depois disso, vieram as
agentes de trânsito da CET e a partir daí não pararam mais. Essas conquistas
todas das mulheres resultaram também na queda do índice de reclamações das
empresas pela metade, além da redução de acidentes recorrentes de trânsito e de
trens.
Sheila e Cynthia pretendem continuar suas
carreiras no metrô, pois enxergam a oportunidade de conduzir trens como um
avanço. Elas garantem que o local é muito bom para trabalhar e que a equipe é
unida e os colegas são extremamente prestativos. Uma equipe predominantemente
masculina, porém, isso não as abala, pois mesmo elas sendo a pequena
porcentagem feminina sabem de seus potenciais e garantem: a mulher tem a mesma
capacidade de realizar tais atividades e se orgulham disso.
segunda-feira, 29 de maio de 2017
Inimigo invisível
Cada vez mais jovens recorrem a medicamentos contra transtornos psicológicos
Por Maria Clara Pereira e Mariana Camargo
A sociedade contemporânea vive sob a exigência de se alcançar o modelo ideal o mais rápido possível. Porém, a busca incessante pelo padrão de beleza e inteligência podem trazer sérias consequências, como o desenvolvimento de transtornos psicológicos, o que leva muitos jovens a recorrer a remédios psicotrópicos para controlar tais doenças. Segundo o Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos Controlados (SNGPC), de 2009 a 2014 houve um aumento de 161% no fornecimento de medicamentos controlados no país.
Os sintomas
Segundo pesquisa realizada em 2016 pelo ERICA (Estudo de Riscos Cardiovasculares em Adolescentes), um em cada três dos adolescentes brasileiros sofre de transtornos mentais comuns (TMC), caracterizados por tristeza frequente, dificuldade para se concentrar ou para dormir, falta de disposição para tarefas do dia a dia, entre outros sintomas. Quando não tratados, esses podem evoluir para distúrbios mais sérios, como a depressão.
A adolescência é marcada por excesso de transformações, associado a isso as pressões impostas pela sociedade (padrão de beleza, notas boas, escolha de uma profissão), e até mesmo pelos pais, pode desencadear na manifestação de diagnósticos de transtornos mentais. A psicóloga Bruna Garcia, 27 anos, concorda “é a associação de vários fatores que propiciam o desenvolvimento de um transtorno mental, e os padrões impostos pela sociedade fazem parte do ambiente em que vivemos, portanto é uma fonte de influência de peso significativo, principalmente para os adolescentes”.
O aumento no consumo
Segundo dados da Secretaria Municipal da Saúde, a quantidade de usuários de medicamentos psicotrópicos em São Paulo teve um aumento de 47% entre 2010 e 2014. O estudante de ciências políticas Fernando Bernardo Júnior, 20 anos, fez uso de medicamentos durante cinco meses após ser diagnosticado com depressão e tendência suicida em 2011, mas diz que se sentiu melhor depois que voltou a ser atleta e parou de se medicar, “além de fortes efeitos colaterais (insônia, tontura, tremedeira, falta de apetite), a pior sensação era a de apatia a qual o remédio me induzia”.
A alta no uso de tais medicamentos reflete maior conhecimento da doença e aumento de diagnósticos, mas também levanta o alerta de uso indevido desses, até por pessoas saudáveis que buscam aumentar o rendimento em atividades intelectuais. “O risco é a farmacodependência, além de efeitos colaterais como alteração do ritmo do sono, comprometimento da cognição, humor e pensamento prejudicados. O psiquiatra deve ser consultado para orientar tais medidas” afirma o psiquiatra Antônio Tornich.
O papel da família
A estudante de ensino médio AP, 17 anos, pensa que “a falta de comunicação com os pais, a falta de liberdade, atrapalha muito”, quando na verdade o papel da família é totalmente o oposto ao lidar com um adolescente, seja ele doente ou não. “Para a família perceber se algo está acontecendo é essencial ter o diálogo. É estar junto, orientar e, a qualquer indício de que algo não esteja bem, buscar um auxílio profissional” acrescenta a psicóloga.
Muitas vezes família e amigos do paciente se negam a aceitar sua condição e dizem que é apenas para chamar atenção. Fernando afirma que “isso afeta negativamente aqueles que sofrem com esses problemas. Quando se é atacado dessa forma fica ainda mais difícil combater aquilo que te derruba”. Para combater esse tipo de opinião, Bruna recomenda a conscientização: “Quanto mais informações as pessoas obtiverem, elas terão mais discernimento, compreensão e entendimento, e assim, conseguirão desconstruir cada vez mais a imagem que lhes foi passada”.
Deve-se lembrar que esses sintomas não devem ser ignorados e em hipótese alguma o paciente deve se automedicar. Os transtornos psicológicos devem ser tratados com auxílio de profissionais da área, os quais têm competência para conduzir um tratamento de maneira adequada, seja com sessões de terapia ou medicação correta. Só assim o paciente pode apresentar melhoras, sem correr risco de prejudicar sua própria saúde.
quarta-feira, 5 de abril de 2017
Diga não ao abuso
Número de mulheres que sofrem violência sexual em ambiente
universitário é alarmante
Por Maria Clara Pereira e Mariana
Camargo
Segundo pesquisa
realizada em 2015 pelo Data Popular, 67% das alunas universitárias já sofreram
algum tipo de violência no ambiente universitário, 28% foram vítimas de
violência sexual, e 27% dos meninos não consideram violência tentar abusar da garota
se ela estiver sob efeito de álcool. 73% dos estudantes conhecem casos de
alunas que já foram abusadas, o ambiente universitário estimula a estrutura
patriarcal ao manter a tradição de que calouros devem obedecer e servir aos
veteranos, ao cultivarem a cultura de cantar músicas ofensivas nos jogos
universitários, ao ter professores homens em sua maioria, ao não dar voz às
garotas, ao não apresentarem nenhuma resolução para tais problemas, mesmo sendo
direito dos alunos recorrer à universidade.
Coletivos
É nesse
contexto em que os coletivos feministas universitários ganham força. Diante de
tantos relatos e nenhuma atitude tomada, as garotas resolveram se organizar
para darem apoio umas as outras e conscientizarem as pessoas de que o corpo da
mulher não é objeto de uso público. Na Faculdade de Medicina de Itajubá (FMIT)
o coletivo existe há dois anos promovendo rodas de conversas para ajudar e
orientar as estudantes, produzindo cartilhas de conscientização (sobre a Lei
Maria da Penha, por exemplo), e contam também com a assistência de uma psicóloga e
uma assistente social fornecidas pela Secretaria de Políticas Públicas Municipal.
A aluna de
medicina Julia Kalil, 19 anos, faz parte do coletivo da FMIT, e, segundo ela, a
falta de atitude da faculdade faz com que até mesmo as meninas que não se
consideram feministas acabem recorrendo ao coletivo em momentos de necessidade.
Segundo os dados do Data Popular, 88% dos alunos e 95% das alunas compartilham
da opinião de que a universidade deveria criar meios de punir os responsáveis
por cometer violência contra mulheres na instituição. Julia
acrescenta que o problema maior se dá por ser difícil mudar uma construção
social já existente, mas que aos poucos mudanças são conquistadas. “De uma
maneira geral, a gente têm conseguido avançar. A própria existência do coletivo
já faz com que as meninas tenham mais coragem de se posicionar”.
Vítima
Após uma festa
em uma república estudantil de Ouro Preto, Letícia Guisard, 20 anos, aluna de
arquitetura na época, relata ter sido abusada por um veterano quando ainda era
caloura. “Foi horrível, nunca pensei que alguém ia passar a mão em todas as
partes do meu corpo sem eu querer. Essa é a pior situação: você não quer
aquilo, você não está confortável com aquilo e a pessoa fica te forçando.”
Mesmo após anos, Letícia diz que nunca teve coragem de contar para as amigas
que moravam com ela o que aconteceu por não se sentir segura e ter medo do que
poderia enfrentar, já que o ambiente na cidade é muito hierarquizado e
machista.
Foto por Mariana Camargo
Que medidas tomar?
A orientação é que se adote medidas legais
independente do tipo de abuso sofrido, seja ele físico ou psicológico. A
advogada Ana Paula Braga, 25 anos, recomenda que a vítima
se dirija o quanto antes para uma delegacia de polícia (preferencialmente da
mulher) e registre o boletim de ocorrência, pois somente com este ela poderá
ser encaminhada para o Instituto Médico Legal (IML) para realizar os exames de
corpo de delito e toxicológico. “São estas as provas que terão mais força na
hora de condenar o agressor, e elas tendem a desaparecer muito rápido.” Embora
a violência ocorra fora do campus, é de responsabilidade da instituição zelar
por seus estudantes, as medidas variam se esta é pública ou particular.
Por ser uma
forma de abuso tão naturalizada, as mulheres demoram a se dar conta da
violência que sofreram, chegando até a aceitarem isso como consequência de seu abuso do
álcool e/ou drogas, 42%das mulheres já sentiram medo de sofrer violência no ambiente universitário. Não são raras as vezes em que o agressor é próximo à vítima,
podendo ser seu namorado, amigo ou até mesmo professor e usar de sua hierarquia
para ameaçar a vítima caso esta queira puni-lo. “A rigor, uma passada de
mão não consentida, um beijo forçado ou qualquer outro ato que envolva
intimidade e teor sexual é considerado estupro”, segundo Ana Paula, e deve ser
denunciado.
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